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Editorial: O conservadorismo e a censura na arte

A atriz Renata Carvalho na peça "O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu" Fonte: Lígia Jardim/Divulgação

Dentre tantos acontecimentos e polêmicas, o mês de setembro ficou marcado pela censura à arte e pela força com que o moralismo voltou aos palcos. A peça O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu, agendada para o dia 15 de setembro no Sesc Jundiaí, viu seu cancelamento decretado pelo juiz Luiz Antonio de Campos Júnior que considera que entes religiosos não podem ser "expostos ao ridículo". O advogado responsável pelo pedido da suspensão das apresentações classificou o espetáculo como "dejeto cultural" e "ultraje" ao cristianismo. O espetáculo, um monólogo que recria a história de Jesus como uma transexual, propõe uma reflexão sobre a intolerância em questões ligadas à orientação sexual.

Em contraste, a Justiça do Rio Grande do Sul, em uma correta decisão, frustrou a tentativa de proibição da peça. O juiz José Antônio Coitinho se recusou a vetar o espetáculo que, conforme ressaltou, está submetida a classificação etária e é apresentada em local fechado. Uma verdadeira defesa da liberdade de expressão.

Ainda na cidade de Jundiaí, a peça A Princesa e a Costureira sofreu com protestos, vindos até mesmo do prefeito da cidade, Luiz Fernando Machado. Em publicação em sua página oficial, o prefeito declara que a peça "cuja temática  é contrária" ao que sustenta como "pai, esposo e prefeito" não possui nenhuma verba pública e ainda que não permitirá nenhuma distribuição de material relacionado nas escolas municipais da rede pública. "Conto com o bom senso dos pais e mães de família de Jundiaí", termina o prefeito. A peça propõe uma mudança no roteiro das histórias clássicas e conta a história de uma princesa que, ao invés de se apaixonar pelo príncipe, encontra o amor em uma costureira.

O conservadorismo não reside apenas em Jundiaí. No dia 10 de setembro a exposição Queermuseu - Cartografias da Diferença na Arte Brasileira que estava em exposição há quase um mês no espaço Santander Cultural, em Porto Alegre, e reunia obras de artistas renomados em torno da temática de gênero, foi cancelada pelo banco após uma série de protestos. É a prova de que nem a iniciativa privada escapa de ações inspiradas em moralismo.

Tais censuras no ramo da arte são o reflexo claro de uma sociedade que cada vez mais pende ao conservadorismo. Grupos como o MBL (Movimento Brasil Livre) exercem uma considerável pressão nos meios digitais e arrastam cada vez mais seguidores, até mesmo em altos cargos da política. O boicote proposto por esses grupos é uma manifestação legítima, concordando-se ou não, assim como cancelamentos realizados por entidades organizadoras da esfera privada.

No entanto, casos como a declaração do Sr. Prefeito Luiz Fernando Machado entre outros da esfera pública constituem como uso abusivo e intolerável do poder do Estado contra a liberdade de expressão e vão contra os princípios da democracia e do texto constitucional, o que é, melhor dizendo, uma censura escrachada.

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