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CRÔNICA: quem precisa de cura é o preconceito


Por Marjorie Wartanian

Doença 
substantivo feminino

1.
med alteração biológica do estado de saúde de um ser (homem, animal etc.), manifestada por um conjunto de sintomas perceptíveis ou não; enfermidade, mal, moléstia."o câncer é uma d. de difícil cura"


2. 
p.ext. alteração do estado de espírito ou do ânimo de um ser."sua tristeza era uma d."


3. 
fig. mania, obsessão, vício."o jogo era a sua d."


Foto do site G1 - Manifestação contra a "Cura Gay" em 21 de setembro


Brasil, 15 de setembro de 2017. Neste dia mais um retrocesso aconteceu no país do carnaval. "Quem o causou?" O preconceito, caro leitor. No entanto, quem, de fato, tornou esse preconceito "palpável" – está lá, no papel – foi Waldemar Cláudio de Carvalho – ele não é o protagonista da história toda, mas sua decisão me deu o assunto desta crônica –, juiz da 14ª vara do Distrito Federal. Esse senhor, que deve ser chamado de meritíssimo no Tribunal, concedeu uma liminar que torna legalmente possível que psicólogos ofereçam pseudoterapias de reversão sexual. Explicando em palavras cotidianas, ele concedeu uma liminar que assume a homossexualidade como um problema e oferece uma cura para ela.

Quando vão entender que homossexualidade não é doença? Coloquei a definição nesse texto, leitor, justamente para que fique claro o não pertencimento da homossexualidade ao grupo de alterações chamadas de doença. Homossexualidade não mata, não altera o estado do ser. O que mata é o preconceito. Ele mata uma pessoa LGBT a cada 25 horas. São 350 mortos por ano. O preconceito com o diferente, com o que não segue o padrão homofóbico da sociedade Brasileira.

A homofobia não consiste só no ódio – gritado aos quatro ventos – e na violência física. Você é homofóbico quando faz aquela piadinha com os amigos ou quando usa a palavra "viado" para xingar alguém. A homofobia está escancarada na liminar concedida pelo juiz do começo do texto. Ao propor uma cura ele automaticamente encarou a homossexualidade como doença. Se não fosse encarnada como doença não precisaria de uma cura!!! Quando o indivíduo sofre todos os dias com o discurso de que ele está errado por ser como é ele vai acreditar que está errado – é a frase "uma mentira dita várias vezes torna-se verdade. Essa crença fará com que ele ache problemas na sua essência e, por pressão social, familiar ou de qualquer tipo, vai se tratar. Assim, a decisão do juiz permite que a sociedade faça um homossexual achar que está errado e procurar uma cura para si mesmo. PROCURAR UMA CURA PARA SI MESMO!

O ponto em que eu queria chegar com esses três parágrafos de texto era: a culpa não é do juiz. Ele apenas seguiu os valores da maioria da sociedade brasileira: conservadora, machista, racista e homofóbica. Sociedade essa que mata, oprime e é violenta com os homossexuais. Por fim, leitor, deixo aqui um desabafo e uma revelação. O primeiro: sou mulher, sou oprimida todos os dias e me sinto péssima com cada opressão diária – se você que está lendo for mulher você vai me entender. Não consigo imaginar alguém que consiga sofrer o dobro do que eu sofro com as opressões – como os gays. O segundo: no começo desse texto, quando o planejei, eu tinha o intuito de falar apenas sobre o juiz e sua decisão... ao decorrer do texto fiquei presa na homofobia – que parece um assunto superado. Mas como falar do juiz e não falar da questão básica que o levou a tomar essa decisão?! O preconceito. É ele que precisa de cura.

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