Por que não estamos falando da neutralidade da rede?
POR ROBERTA DOMINGUES
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"Neutralidade da rede é liberdade de expressão" Foto: Ronen Tivony / Global Look Press |
Ao assinar um pacote de Internet no Brasil, paga-se pela velocidade da rede pretendida, que pode variar de 2 até 500 MEGA, dependendo da necessidade pessoal de cada um. Isso quer dizer que, independente da velocidade escolhida, o acesso às redes sociais, vídeos, filmes, downloads, e sites em geral não é limitado, exceto pela velocidade que a banda larga fornece — vídeos 1080p no Youtube demorarão muito para serem carregados em uma internet de 2 MEGA, mas é possível vê-los. O fato de nenhum provedor poder regular o conteúdo que é possível visitar de acordo com um plano de Internet é chamado de “neutralidade da rede”. Em 23 de abril, essa neutralidade vai acabar. Pelo menos será assim nos Estados Unidos.
COMO FUNCIONARÁ?
Em uma votação realizada em dezembro do ano passado, a Comissão Federal de Comunicações dos Estados Unidos decidiu por alterar as normas sobre neutralidade da rede tomadas no governo de Barack Obama. Agora, o provedor de internet poderá decidir — por meio de diferentes planos de assinatura — o que cada usuário poderá visualizar na rede.
Por exemplo: dependendo do plano assinado, um usuário pode ter acesso ao Youtube e ao Facebook, mas não ao Twitter; outro plano poderá fornecer todas as redes sociais, mas não sites de notícias ou páginas acadêmicas.
Com a derrubada da neutralidade, os provedores de Internet vão ter liberdade para bloquear ou distribuir conteúdo como bem entenderem, ou cobrar diferentes valores para quem quiser acessar diferentes tipos de conteúdo — a única obrigação dessas companhias será divulgar os métodos de cobrança.
JUSTIFICATIVA E PROBLEMÁTICA
As empresas de comunicação afirmam que não é dever do Estado gerenciar a Internet. Por isso é importante a liberdade de concorrência. Um usuário de área remota, que conta com poucas opções de provedor, poderia pagar um plano com acesso a um só serviço (redes sociais, por exemplo), e estaria conectado ao que os provedores decidissem ofertar na área, assim estimulando a concorrência de serviços nessas áreas remotas.
Porém, um dos problemas é que uma das empresas pode decidir diminuir a velocidade ou qualidade de conexão enquanto o serviço de um concorrente é utilizado. Se a neutralidade da rede realmente cair, os provedores de internet não precisariam informar seus clientes.
Sérgio Amadeu, membro do Comitê Gestor da Internet (CGI), informa: “Temos uma rede aberta, democrática. Com a quebra da neutralidade, você burocratiza, e pode obrigar aos criadores de novos aplicativos e ferramentas a terem que negociar com as operadoras o acesso aos seus serviços”. Em suma, o criador de algum novo aplicativo ou site teria que negociar com essas grandes empresas de telecomunicações a permissão para que o público acessasse seu conteúdo. Isso é especialmente prejudicial aos pequenos negócios e sites/ferramentas de minorias, que poderiam ser vetados por não se “adequarem” aos princípios dos provedores. A lei hoje permite igual acesso a todas as pessoas e empresas que queiram lançar serviços ou produtos online.
A Internet tem sido um espaço acolhedor para aqueles que são mal representados pela mídia e não têm voz em meios de comunicações grandes. É por meio da rede que a liberdade de opinião dessas minorias — mulheres, negros, o próprio grupo LGBT+ — é garantido. Se a neutralidade da rede cair, as vozes dessas pessoas podem ser novamente abafadas e até mesmo censuradas. Sem a internet livre, as minorias perderiam uma importante plataforma para a divulgação de seus ideais.
O mesmo ocorre para os pequenos negócios. Sem o apoio da internet livre, startups sequer conseguiriam concorrer com grandes empresas, o que arruinaria a livre competição tanto prezada pelo sistema. Novas plataformas importantes, como o próximo Google ou Facebook, jamais sairiam do papel.
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"A democracia depende do acesso igualitário de todos às informações" Foto: Flickr/Tim Carter |
NO BRASIL
O governo brasileiro não tem planos para acabar com a neutralidade da rede, e até mesmo se posiciona contra. Em entrevista, Gilberto Kassab, ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, diz que o governo é contrário ao fim da neutralidade. “Somos contra. O Brasil não está preparado para essa discussão. É uma decisão de poder político. Não terá iniciativa política nesse sentido”. Ainda segundo ele, o Brasil não está pronto para discutir essa questão porque ainda se vê tentando conectar mais pessoas à rede com o projeto Internet Para Todos, em especial àquelas que moram em áreas isoladas.
O Marco Civil da Internet, assinado em 2014 pela ex-presidente Dilma Rousseff, assegura a neutralidade na rede no país. Segundo ele, deve-se “tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino”.
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