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A influência da pornografia nas relações sexuais

POR THAYS REIS


Campanha contra assédio e violência sexual. Foto: Faël Isthar

Com o advento da internet, a indústria pornográfica passou da dificuldade de acesso dos filmes e revistas para um compilado infinito de vídeos que pode ser acessado de qualquer lugar.. A sua grande disseminação entre jovens e adultos revela inúmeras consequências na saúde sexual e mental de muitos jovens, desde atitudes agressivas no sexo até a total ignorância do prazer feminino, que é absolutamente negado nos sites pornôs.

Segundo informações do Daily Mail com jovens britânicos (não há muitas pesquisas sobre o assunto no Brasil), a maioria dos adolescentes assiste “conteúdo adulto” pelo menos de duas a três vezes na semana. Dois terços de jovens entre 11 e 13 anos já viram pornografia online, cuja frequência aumenta junto com a idade: 75% dos jovens de 13 a 17 anos já viu esse tipo de conteúdo. Isso significa que, desde o início da adolescência, os jovens estão expostos a formas de sexo que não são, nem deveriam ser, a realidade. Mas uma forma de se relacionar que decorre de uma sociedade machista e violenta.

Como os filmes são feitos, obviamente, para o público masculino, os garotos são os mais afetados pelas visões de mundo expostas nos filmes. Na grande maioria, não se explora a sedução, as conversas, a conquista, que são partes fundamentais para um sexo saudável e consentido, o que não se trata de romantizar o sexo, mas de tratá-lo com verossimilhança sem objetificar os protagonistas da relação. 

A única coisa realmente valorizada nos vídeos é a penetração. Sem toques, sem beijos, sem olhares, sem nem mesmo mostrar o prazer que poderia advir daquilo. Apenas uma penetração mecânica onde o homem mal toca a mulher e ela. por sua vez, se preocupa apenas em não estragar seu cabelo e maquiagem, além de claro, fingir prazer.

Mais do que a frieza, a violência e a brutalidade no sexo são extremamente normalizadas, explorando a hierarquização dos gêneros, quando o homem está sempre em posição de dominação sobre a mulher submissa. O extremo desse domínio e violência estão presentes em categorias como “hardcore” e “estupro”, que tornam normal e corriqueiro um homem sentir prazer em ver uma mulher sendo abusada, enforcada, chorando ou coisas muito mais violentas que isso.

O quão problemático é sentir prazer com a dor do outro? Esse desejo de dominação e poder sobre mulheres advém, não de um fetiche individual, mas de uma sociedade machista e falocêntrica que prioriza o prazer do homem e sequer coloca em pauta o prazer feminino – exageradamente representado nos filmes com mulheres gritando, quando nem ao menos estão sentindo prazer – mas que idealiza sempre a mulher “boa de cama” que é submissa, não expressa seus desejos e vontades, mas que satisfaz todos os desejos masculinos.

Esse tipo de dominação é explorado não só em filmes pornográficos, mas em sucessos de bilheteria como “50 tons de cinza” que, para além do sadomasoquismo, aborda essa questão do limite entre prazer e dor, entre a vontade de realizar um fetiche pessoal e ao mesmo tempo levar em consideração o que a outra pessoa. E mais que isso, ensinar uma forma violenta de se relacionar com uma pessoa que não necessariamente gosta ou quer se relacionar dessa forma, mas se submete por acreditar em sentimento romântico que pode vir disso.
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Outro filme que aborda essa temática é Operação Red Sparrow, com protagonismo de Jennifer Lawrence na personagem Dominika, que se envolve com a espionagem russa e aprende a decifrar o que as pessoas desejam e conseguir o que quer através disso. Em uma das cenas, após Dominika sofrer uma tentativa de estupro, ela é convidada por sua superior a dar ao homem que tentou estuprá-la, o que ele deseja. Dominika tira suas roupas e se mostra disponível para ter relações sexuais. Quando ele não fica excitado, ela diz algo como “Ele não quer sexo, ele quer poder”. 

Mais assustador é quando a violência sai da tela do cinema para a vida real, em forma de violência no sexo com mulheres e suas representações, como a brutalidade ocorrida no Festival de Arte Eletrônica de Linz, em 2017, contra a boneca Samantha, um robô que imita uma mulher, com sensores em áreas erógenas e inteligência artificial, capaz de aprender frases e coisas que o possível parceiro goste.

Boneca Samantha. Reprodução: O Globo Blogs
Na visão da indústria pornográfica, Samatha é a personificação de “mulher perfeita”: calada, submissa, sem desejos ou vontades e utilizada apenas para realizar os desejos masculinos. E foi exatamente isso que participantes da feira fizeram, realizaram seus desejos: sujaram, humilharam e estupraram um robô que representa uma mulher. Quebraram seus dedos, pernas, arrancaram seus seios e a deixaram tão danificada, que seu corpo não poderia ser mais utilizado, apenas sua tecnologia interna.

Samantha se presta a imitar uma mulher real e a atitude de um grupo de homens que se sentiu à vontade para aplicar à boneca todo tipo de castigo que a lei severamente puniria se fosse aplicado a um ser humano, representa uma ameaça real às mulheres, já que só o que impede alguns homens de cometer esse tipo de violência é o medo e a culpa, mas aprenderam a ser violentos e a sentir prazer com isso. 

O comportamento violento nas relações sexuais não se dá apenas por conta da pornografia, mas por conta de uma sociedade machista e misógina, dentro da qual os conteúdos adultos estão inseridos e se mostram de forma clara e óbvia. Os vídeos e filmes não só incentivam o comportamento agressivo, mas normatizam a falta de respeito com as mulheres, a ignorância de seus desejos e vontades. 

Sem nem entrar no mérito dos perigos e violências sofridas pelos atores e, principalmente atrizes, que são 70% das protagonistas, que geralmente não chegam nem aos 50 anos, por conta de drogas, DST’s ou assassinatos. Nem na problemática de “teen” ser o tema mais pesquisado em sites de conteúdo adulto, em alusão a pedofilia. Nem aos estereótipos de homem branco dominador, adolescente branca ingênua e inexperiente, mulheres não-brancas como exóticas e “aventuras” sexuais e homens negros como “bem-dotados”. Ideias que são consumidas subjetivamente durante o conteúdo dos vídeos.

Esse tipo de conteúdo traz inúmeras violências, explícitas, implícitas e causam consequências tanto em quem está envolvido ativamente nessa indústria, atores e atrizes, como em quem a consome.

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