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Tempos Modernos?

9 de maio de 2018

Por Enzo Kfouri


Essa semana vem com uma boa notícia para os fãs dos esportes olímpicos. A partir de uma parceria firmada entre o Olympic Channel e o Grupo Globo, maior grupo de mídia do país, entusiastas olímpicos de todo o Brasil terão novas oportunidades de acesso à experiência e à emoção dos Jogos Olímpicos.

Aros Olímpicos na Cerimônia de Abertura das Olimpíadas do Rio, em 2016. Fonte: ESPN
A partir de agosto, será possível assistir ao conteúdo original do canal Olímpico e ao conteúdo olímpico da Globo durante blocos de programação do “Olympic Channel” dentro de programas esportivos da maior emissora do país, como o semanal do canal aberto “Esporte Espetacular”. Também estará disponível na grade dos canais por assinatura “SporTV” e no meio digital, através do “Globoesporte.com”, que contará com uma seção exclusiva para tal.

A programação irá apresentar durante todo o ano a cobertura dos esportes Olímpicos e de atletas e funcionará como uma cobertura mais eficaz dos esportes que não possuem tanta visibilidade na mídia brasileira atualmente. O acordo, firmado até 2032, marca um grande passo na estratégia de distribuição do “Olympic Channel” na América do Sul e amplia os direitos de mídia para os Jogos Olímpicos acordados entre o COI (Comitê Olímpico Internacional) no Brasil e o Grupo Globo.

A proposta é ampliar o alcance do “Olympic Channel” e visa promover a divulgação de conteúdo dos mais diversos esportes. Vale lembrar que o canal olímpico, que teve estreia mundial após a Cerimônia de Encerramento dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, é uma plataforma multimídia destinada para que fãs de esporte possam descobrir, experimentar e dividir experiências proporcionadas pelo esporte e as emoções dos Jogos Olímpicos durante todo o ano.

"Olympic Channel" e Grupo Globo firmam parceria para ampliar a cobertura dos esportes olímpicos. Fonte: Reprodução

A plataforma já oferece programas originais, notícias, eventos esportivos ao vivo e destaques, promovendo a exposição de esportes e atletas 24 horas por dia, 365 dias por ano, em 11 idiomas. O projeto faz parte da Agenda Olímpica 2020 do COI e tem o objetivo de atrair novas gerações, fãs e audiências para o movimento olímpico. Os parceiros que apoiam o “Olympic Channel” são a Bridgestone, Toyota e Alibaba e ele está disponível em todo o mundo através dos aplicativos para as plataformas Android e iOS e pelo site www.olympicchannel.com

Desse modo, o ocorrido nessa semana somente confirma o período em que estamos vivendo: a era da convergência. Os meios de comunicação convencionais estão cada vez mais migrando para o digital e para a mídia horizontal, como são chamadas as redes sociais. Esse não é o primeiro exemplo de cobertura transmídia no esporte: nos amistosos entre Brasil e Austrália e Brasil e Argentina, em junho do ano passado, a CBF realizou a transmissão dos esportes via Live de Facebook, além da tradicional cobertura pela TV aberta, presente em canais como a TV Cultura e TV Brasil.

Tocha Olímpica durante Cerimônia de Abertura das Olimpíadas de 2016. Fonte: Reprodução

Assim, pode-se imaginar o futuro da transmissão esportiva no mundo. A parceria entre o Olympic Channel e a Rede Globo pode significar um grande passo para a democratização dos esportes no Brasil. Talvez, com a cobertura cada vez mais eficaz em TV aberta em todo território nacional, os “outros esportes” (como são nomeadas as modalidades que não o futebol) ganhem mais visibilidade e popularidade no país.

Talvez, a partir dessa cobertura, poderemos enfim perceber se realmente o esporte não é difundido no país por conta da falta de transmissão ou se a falta de transmissão ocorre porque o esporte não é difundido e não dá dinheiro no país, como muitos argumentam. Para os  e torcer literalmente para que a proposta seja bem recebida pelo público e que esse seja apenas o começo de uma cobertura cada vez mais democrática no Brasil e no mundo.que lutam pela valorização dos “outros esportes” ou para os fãs olímpicos, resta aguardar

Cerimônia de Encerramento das Olimpíadas de 2016 e início da Agenda Olímpica 2020 do COI. Fonte: Reuters

O poder transformador da poesia marginal

24 de abril de 2018

Por Thays Reis


Slam das Minas representado por Luz Ribeiro, Mel Duarte, Pam Araujo e Carolina Peixoto. Foto: Renata Armelim

Em meio a racismo, misoginia, pobreza e amores, a população periférica resiste e mostra sua potência na arte. Faz da vivência, poema e com um grupo de palavras, concretizam a transformação. A poesia das margens faz pela sociedade muito mais do que a Academia já fez. Aproxima a arte do cotidiano, devolve a política para as mãos da população e une diversas pessoas para trocar histórias e se ouvirem mutuamente. Como diz o poema da slammer Mariana Felix, “A poesia marginal explica: Foi o hip-hop e não os decassílabos dos lusíadas que fez muito moleque que hoje escreve, enfim, parar de cheirar cocaína”.

Os Slams são campeonatos de poesia, em que os participantes possuem apenas 3 minutos para apresentar sua arte – uma poesia sem adereços ou acompanhamento musical. Geralmente de autoria própria. O Júri é escolhido na hora na plateia e dá notas de 0 a 10, mesmo que os ouvintes sempre gritem “credo!” quando a nota é abaixo do limite máximo.

Juradas dando nota máxima a poeta participante. Foto: Renata Armelim

Movimento que teve início em Chicago, Illinois, com Marc Smith em 1984, o slam ou ainda conhecidos em inglês como poetry slam ou spoken word (palavra falada, em inglês), se espalhou pelo país e, nos anos 90, pela América. Foi adotado por muitos jovens e artistas independentes, que viram nessa forma de fazer arte uma oportunidade de ampliar a literatura e fazê-la mais acessível, desde seu público ao seu conteúdo. A intenção era e ainda é fazer uma arte próxima da vida cotidiana, próxima da vida real e da população.

O nome “Slam” também não é traduzido. Seria uma representação de um barulho, um estrondo, algo como uma porta se fechando alto. Essa onomatopeia simboliza o conteúdo das poesias recitadas, textos fortes, impactantes, com barulho, com grito, com uma crítica que pode causar inúmeras sensações, de risadas a lágrimas nos olhos. É sentimento e intensidade, diferente da usual declamação pausada de poesia clássica.

Nos slams se discute amor a política, abuso e violência. Racismo, feminismo e a luta de classes e suas desigualdades também se fazem sempre presentes. Em 3 minutos os poetas tomam as responsabilidades pra si, representam um grupo e falam pelas dores próprias e dos seus iguais, que retribuem gritando, aplaudindo e participando ativamente das apresentações.

No Brasil, a primeira batalha de poesia foi idealizada por Roberta Estrela D’alva, atriz, diretora e poeta que ganhou em terceiro lugar na Copa do mundo de Poesia Slam de 2011, além de membra fundadora do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, que mistura teatro com hip-hop. Foi o coletivo que organizou a primeira competição da poesia, chamada de ZAP – Zona Autônoma da Palavra.

SLAM DAS MINAS

O Slam das Minas surgiu no Distrito Federal em 2015, seguido por São Paulo, Goiânia, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Pernambuco, Salvador, Minas Gerais, Belém, Alagoas, Mato Grosso e com projeção para crescer ainda mais. 

Tatiana Nascimento, idealizadora desse slam feito apenas por mulheres, trata o sucesso da ação como uma semente que frutifica. “Acho que isso tudo é quinem achar uma semente alada, dessas que têm asas translúcidas y às veis passam displicentes num vento morno na frente da nossa mirada: pequena, delicada, secreta, mas corajosa…”; é assim, com uma narrativa poética, rica na simplicidade, com diversas influências e elementos, que Tatiana descreve o processo de disseminação do Slam das Minas na introdução do livro “Mudas - falas são sementes em germinação”, livro independente de 25 poetas que já passaram pelo Slam das minas.

A Casa das Rosas foi anfitriã do Slam das Minas, pela terceira vez, em um evento que ocorre anualmente. Em cima do palco quatro mulheres unidas pelo mesmo ideal: criar um espaço de voz e acolhimento para as minas, monas e manas no contexto da competição de poesia falada. 

E elas dão o recado logo no começo da tarde, no evento realizado na Casa das Rosas, com seu manifesto, ou melhor “Manifesta”, que convida as mulheres a falarem, os homens a respeitarem e, por fim, convida o participante a se abrir à transformação. “Prepare sua alma, do jeito que entrou aqui, não mais sairá”, uma profecia do Slam das Minas que se cumpre a cada encontro espalhado pelo país.

Com direito a Pocket Show de Danna Lisboa, artista trans e negra, lançamento do livro Sangria de Luiza Romão e uma pequena apresentação de dança descontraída das organizadoras, o encontro foi cheio, não só de poesia, mas de pessoas compartilhando suas próprias histórias dispostas a se ouvirem, além de uma novidade no Slam das Minas SP: Foi o primeiro evento que contou com intérprete de libras, garantindo maior acessibilidade.

Antes da competição de fato, o microfone ficou aberto para qualquer um que desejasse falar, nessa fase não há jurados nem notas, apenas as performances. Uma dupla que se destacou foi “OsRetirante”, um homem e uma mulher que constituem um projeto de resgate da cultura nordestina que recitou um poema sobre a segunda violenta Guerra de Canudos.

Depois do aquecimento, começa de fato a competição. “Slam das minas, monas monstras!” é o grito de guerra antes de cada poesia e, a partir desse momento apenas mulheres falam. Na maior parte das vezes política e social, a crítica se faz exemplificando na própria vida, o contexto de uma problemática maior. Temas como o machismo, misoginia, racismo, violência e religião foram recorrentes nas pautas das mulheres que passavam pelo microfone. 

As poetas recitaram seus poemas e, após uma primeira rodada em que todas as inscritas se apresentaram, só passou para segunda quem gabaritou a pontuação, ou seja, recebeu 10 pontos de cada uma das 3 juradas escolhidas aleatoriamente na plateia.

Kimani e Luiza Romão, vencedoras do slam. Foto: Renata Armelim

Kimani, poeta que mostra a militância na sua arte, ganhou em primeiro lugar junto com a escritora Luiza Romão, que aborda temas como a corrupção e frustração na política e estava lançando seu livro Sangria. O terceiro lugar foi conquistado por Tayla Fernandes com poemas sobre ser mulher e sobre o preconceito contra a população negra.

Assistente social e estudante de psicologia na FMU, Cynthia Santos adotou o vulgo Kimani, que significa menina doce em africano, para publicar as coisas que escrevia sem que a identificassem. Hoje, sem medo de dizer o que pensa, o vulgo representa sua força e potência.

Poeta Kimani declamando sua poesia. Foto: arquivo pessoal.
A poeta conta que seu gosto pela escrita vinha desde pequena em cartinhas de amor que escrevia para a família, mas foi para lidar com um fim de relacionamento que essa escrita se aprimorou e se tornou crucial na sua vida. Hoje sua poesia tem muito a ver com sua luta. “Pra mim é muito tranquilo escrever uma poesia sobre ser negra ou sobre me incomodar com a possibilidade que uma classe social tem e outra não, porque eu sou assistente social, é isso que eu vivo diariamente”, explica a poeta “escrever é só um desabafo, um contínuo e, de certa forma, uma resposta”.

Kimani conheceu o campeonato de poesia através de vídeos do Slam Resistência, grupo que se reúne toda primeira segunda-feira do mês na Praça Roosevelt. Porém, a primeira vez que participou foi no Slam da Norte em março de 2017; “minha primeira vez foi bem forte, como são todas as vezes, mas no começo você aprende e percebe que tem 3 minutos para falar e ser ouvido. Para alguém que nunca fala, nunca comenta o que sente, 3 minutos é uma eternidade para você se expressar.”

O Slam cresceu consideravelmente nos últimos anos e, mais do que tamanho, ganhou importância na vida dos jovens, que podem se expressar e serem realmente ouvidos. Como estudante de psicologia, Kimani acredita que a fala é um processo terapêutico que ajuda as pessoas preteridas e excluídas do sistema a se encontrarem e lidarem com suas questões pessoais ou num sentido coletivo: “A fala é terapêutica porque você precisa decodificar todo um emaranhado de sentimentos. É preciso entender, peneirar e racionalizar esses sentimentos em escrita. Além disso, o ser ouvido também é terapêutico e o slam promove isso, um espaço onde as pessoas podem falar e serem ouvidas.”

Danna Lisboa se apresentando na Casa das Rosas. Foto: Renata Armelim

Além de ouvir a voz de inúmeras pessoas preteridas na poesia, o Slam das Minas também convidou uma artista trans e negra para fazer um show. Danna Lisboa realizou um pocket show, dançou junto com a plateia e entre cada música, contava um pouco de sua história e de sua luta por ser uma mulher trans negra.

Danna começou sua carreira nos palcos LGBTQ+ de São Paulo nos anos 2000 e, após um período de sucesso se apresentando, passou por um relacionamento abusivo que a fez desenvolver depressão em 2006. Depois de um período de luta e luto, encontrou na dança incentivo e uma maneira de sair daquela situação. A cantora já escrevia músicas antes de se apaixonar pela dança, mas foi com o tempo e unindo os dois amores que ela foi criando coragem para mostrar sua música. “Daí pra frente fui descobrindo mais e mais sobre meu som e agora estou aqui.”

Na cena musical, Danna vê várias pessoas trans ocupando os espaços e fazendo sua arte, mas acredita que nada está ganho ainda: “eu passo transfobia quase todo dia, mas a arte é um meio de informar e educar. Acho que estamos caminhando, mas a existência de pessoas trans na sociedade ainda está longe de ser normalizada”.  

Não Vai Ter Copa?

18 de abril de 2018

Por Enzo Kfouri

Meses antes da Copa de 2014, discutia-se nas ruas a possibilidade de ocorrer ou não o evento no Brasil por conta dos protestos que tomaram as ruas no ano anterior. Quatro anos depois, a dois meses do jogo de abertura da edição de 2018, a realização do torneio se tornou uma incógnita, não por impopularidade entre os locais, mas por conflitos diplomáticos que envolvem o país sede e os EUA.

A Rússia possui estreita ligação com o governo sírio, de Bashar Al-Assad,  e o presidente russo Vladimir Putin já havia declarado durante a semana passada que uma ação militar do ocidente em território sírio poderia desencadear uma guerra. Rebatendo a essa afirmação, o presidente dos EUA Donald Trump ironizou no Twitter: “A Rússia promete abater todos os mísseis direcionados à Síria. Prepare-se, Rússia, porque eles serão lançados"

Putin e Trump se cumprimentam em encontro durante a cúpula do G20. Fonte: REUTERS/ Carlos Barria  


Entre farpas em redes sociais e ameaças vazias, todo esse caso ganhou uma repercussão maior quando, na sexta-feira (13), mísseis foram lançados de fato, em um ataque de coalizão orquestrado por EUA, Reino Unido e França contra pelo menos três instalações ligadas a armas químicas nos arredores de Damasco, capital da Síria.

Em resposta ao ocorrido, blogs, perfis e páginas nas redes sociais já adiantam o que seria a concretização de uma Terceira Guerra Mundial. Paralelamente ao aspecto político, suscita-se na internet a dúvida sobre a realização ou não da Copa do Mundo realizada entre junho e julho deste ano em território russo.

Estádio do Maracanã em partida pela Copa de 2014. Fonte: Divulgação/Maracanã

“Segundo o regulamento da FIFA, se o país-sede da Copa estiver em guerra, o evento será realizado na sede anterior”. Essa mensagem circulou fortemente no Facebook e em grupos de Whatsapp, criando nas pessoas a esperança ou a decepção de que o Brasil receberia novamente a Copa. Entretanto, ao contrário do boato espalhado, o regulamento da Copa do Mundo de 2018 é claro e não traz a possibilidade nem do retorno do torneio à sede anterior e nem de ele não acontecer na Rússia.

 Somado a isso, com menos de dois meses para o apito inicial, é impossível  pensar em uma mudança de sede, uma vez que a maioria dos ingressos já foi vendida e é indispensável a realização de eventos-teste antes da competição. Para alegria ou tristeza dos brasileiros, o mais plausível seria o adiamento da competição, como já aconteceu antes, inclusive em períodos de guerra.

Seleção Brasileira durante o hino à capela antes do jogo contra o México na Copa de 2014. Fonte: Estadão
Depois da Copa de 1938 na França, a FIFA optou por não realizar as edições de 1942 e 1946, por conta da 2ª Guerra, adiando o retorno do evento para 1950 no Brasil, um território considerado neutro. Outra ocasião semelhante foi a mudança da sede da Copa de 1986 para o México. Inicialmente o mundial deveria ter sido realizado na Colômbia, que desistiu por conta de dificuldades econômicas e da insatisfação com as exigências da FIFA.

Imaginando um cenário catastrófico, o mais provável seria o adiamento da competição, talvez para 2019 ou 2020, dependendo da situação política que a Rússia se encontraria. De qualquer forma, dificilmente voltaria ao Brasil, já que também há o critério de rodízio de continentes na escolha do país-sede, devendo a próxima Copa ser realizada na Europa ou na Ásia. Assim, fãs ansiosos com o retorno da competição em territórios nacionais, resta apenas esperar por mais alguns anos, caso o país volte a se candidatar no futuro.

Lolita, a orca esquecida

9 de abril de 2018

Pela colaboradora Giulia Espir



Lolita em seu tanque, em Miami. Foto: divulgação


“É apenas trágico que Lolita seja mantida nesse ambiente torturador por tanto tempo” é assim que a Dra. Ingrid N. Visser, única bióloga marinha especializada em orcas do mundo, descreve a situação de Lolita. Em seu mini documentário “A Day in the Life of Lolita, The Performing Orca” a bióloga aponta que a orca vive há mais de 40 anos isolada no Miami Seaquarium, na Flórida.

A baleia foi aprisionada na maior captura de orcas da história, quando sete animais da espécie foram enclausuradas e vendidas para parques marinhos pelo mundo. Com apenas quatro anos, e por míseros US$6000, foi vendida para o Miami Seaquarium onde vive até hoje.




Lolita é a orca mais velha do mundo em cativeiro, pesando por volta de 3 toneladas e medindo em torno de 6 metros. Ela vive no menor tanque dos EUA, com aproximadamente 10 metros de comprimento, 24 metros de largura e 6 metros de profundidade no seu ponto mais fundo. Essas condições estão em total desacordo com as normas do Serviço de Inspeção Sanitária e Fitossanitária de Animais e Plantas (APHIS), departamento responsável por essa fiscalização. De acordo com o órgão, o tanque deve ter no mínimo 14 metros de cada lado a partir do ponto central. Além disso, o tanque de Lolita não possui proteção alguma contra o sol, o que pode causar bolhas na pele da baleia e outras complicações. Apesar do conhecimento das irregularidades no Seaquarium de Miami, as autoridades americanas se negam a tomar medidas contra esse absurdo e Lolita continua sofrendo com as consequências, demonstrando que o governo americano não está interessado em proteger os animais que lá vivem (ou sobrevivem).

As orcas são chamadas de baleias assassinas, mas são mamíferos marinhos que pertencem à família dos golfinhos e se alimentam de focas, arraias e peixes. Esses animais – apesar do nome – são extremamente inteligentes, sociáveis e vivem no mesmo grupo durante toda a vida. Também é sabido que essa espécie pode nadar mais de 160km diários enquanto fazem diversas atividades como caçar, dormir e brincar em grupo. Portanto, Lolita estar a mais de 40 anos confinada em um tanque minúsculo e sem nenhum contato com outro animal de sua espécie é uma atrocidade.

Em cativeiro, é comum que orcas apresentem comportamentos anormais e repetitivos, como ficar flutuando sem vida por horas, bater a cabeça contra o concreto, roer as paredes e tirar a cabeça da água reiteradamente. Tal conduta causa sérios danos a saúde dos animais, como ingestão de toxinas, dentes quebrados e machucados na pele, o que leva a diversos tipos de infecções que podem ser fatais. Segundo a Dra. Visser é possível observar exatamente essas atitudes em Lolita, que também exibe queimaduras pelo corpo por conta do sol escaldante de Miami.




Há um plano para que a baleia possa se aposentar em paz, longe dos shows e desse ambiente deplorável em que vive. A ideia é readaptá-la para a vida no oceano, ensinando-a como nadar em um espaço maior e alimentar-se de peixes vivos. Para isso, o plano é leva-la para uma baía que será fechada com redes, onde Lolita poderá ter a sensação de liberdade e a experiência do mar, mas de uma forma controlada. Após esse treinamento, ela será solta no mar aberto, onde poderá se reunir com sua família - que ainda está viva segundo pesquisadores da área que acompanham o grupo a anos.



Mesmo com todos os dados do plano indicando ser o melhor para o bem-estar de Lolita, o Seaquarium de Miami não concorda que a baleia deve ser aposentada e libertada para um ambiente digno de se viver; ao contrário, eles alegam que ela deve permanecer aonde está, pois está sendo bem cuidada e é o lugar mais seguro para ela. Obviamente essa seria a opinião da administração do parque, já que a baleia é vista apenas como um meio de lucro e como um objeto para o entretenimento humano. Apesar de inúmeras tentativas de ativistas para libertar o animal, a corte dos EUA também não aceitou o caso alegando que não há provas suficientes que indicam os maus tratados de Lolita. Em meio a tudo isso, a orca continua confinada e sozinha no menor tanque dos Estados Unidos, apenas esperando o seu fim. É claro de perceber que a situação de Lolita é precária - para dizer o mínimo - e que a crueldade humana não tem limites quando se trata de lucrar com animais enjaulados.

Resultado de imagem para #freelolita


"Isso não é 'entretenimento familiar'" Foto: campanha na internet


Ativistas como a Dra. Visser e a ONG PETA (Pessoas pelo Tratamento Ético dos Animais) continuam a lutar para que Lolita seja libertada e possa viver o resto de seus dias em um lugar digno para uma orca. Além disso, existem diversas petições e protestos com a hashtag #freelolita circulando pela internet, contudo é de extrema importância que a história dessa orca seja espalhada e compartilhada. Após mais de 40 anos sozinha e presa a uma “piscininha”, Lolita merece a liberdade e um final feliz.

#freelolita















Mulheres Loucas

26 de março de 2018

POR ALINE REIS

O mito da histeria feminina

Na Grécia Antiga, a histeria era diagnosticada como uma doença que acometia somente mulheres. A causa era atribuída ao deslocamento interno que o útero realizava em busca de umidade. No século XIX já havia uma lista com mais de 75 sintomas atribuídos à doença, que incluem irritabilidade, insônia, ansiedade e outras questões de natureza sexual. Assim, as reações emocionais legítimas das mulheres eram catalogadas como sintomas de uma doença, resultando em um controle constante sobre toda a expressão sentimental num geral - tanto por parte dos homens quanto por parte das próprias mulheres, que podavam a manifestação emocional com medo de serem consideradas doentes.

Assim, as mulheres eram constantemente desacreditadas, já que qualquer reação emocional era considerada um sintoma da histeria. A suscetibilidade à doença tornava o discurso vindo de uma mulher menos plausível do que quando vindo de um homem, atestando, portanto, a inferioridade tanto física quanto psicológica do sexo feminino em relação ao masculino.

TPM: a loucura moderna

Praticamente todas as mulheres - após uma reclamação ou um comentário mais enérgico - ouviram: "mas você tá de TPM?". Novamente, uma reação natural do corpo feminino é utilizada para diminuir e deslegitimar a fala da mulher, que tem suas vontades e ações resumidas a uma função hormonal, deixando de ser tratada como um ser de mesmo valor racional quando comparada com um indivíduo masculino.

Paola Paredes

A Tensão Pré-Menstrual (TPM) é um período de alteração hormonal que ocorre em mulheres, antecedendo o período menstrual. Seus sintomas apresentam variação de acordo com fatores sociais e culturais, causando reações distintas entre cada mulher. Além disso, nem todas as mulheres exibem sinais, tanto emocionais quanto físicos, de TPM durante o ciclo menstrual.

Ainda que de fato resulte em uma mudança no comportamento da mulher, a TPM não é um monstro a ser combatido ou um fator negativo. Quando acontece, é o indicador de reações normais, ajudando no controle da saúde feminina. A TPM não deve ser usada como uma arma para reduzir as expressões femininas, como normalmente acontece. Por exemplo, se no trabalho uma mulher tem pulso firme e exige o máximo de produtividade de seus funcionários, ela é chamada de frígida ou questionada sobre a situação de seu ciclo menstrual a todo o momento. Já quando o mesmo comportamento é advindo de um homem, ele é considerado profissional e preocupado com o bom funcionamento da empresa. Mulheres podem ser firmes e profissionais ao mesmo tempo em podem ou não menstruar. No fim das constas, isso não deveria ser um critério na hora de atestar a qualidade de uma mulher, seja no ambiente de trabalho ou em qualquer outra situação.

Uma mulher com raiva é uma mulher com raiva, uma mulher triste é uma mulher triste, ainda que tenha influência sobre isso, a TPM não é a única causa dos sentimentos nas mulheres. Mulheres sentem coisas todos os dias, independentemente da situação de seu ciclo menstrual.

Está na hora de parar de reproduzir discursos tão arcaicos. As mulheres não são loucas guiadas por seus hormônios. Mulheres, assim como os homens, são seres racionais que passam por situações que despertam diversas emoções ao longo do dia. Diminuir essas emoções diminui a mulher como ser humano, e mulheres não devem ser diminuídas.

Fontes:

A Glória Inesperada

23 de março de 2018


POR ENZO KFOURI

JUCA 2014: Após campanha espetacular no vôlei feminino, o esporte na PUC-SP nunca mais seria o mesmo.



 Times da PUC-SP e do Mackenzie se cumprimentam após o confronto válido pelas semifinais no JUCA de 2014. Fonte: Atlética de Comunicação da PUC-SP

Ideais, modos de pensar e estruturas totalmente diferentes. Localização próxima. Tentar explicar para pessoas de fora a rivalidade entre PUC-SP e Mackenzie pode ser extremamente difícil, mas o fato é que as duas maiores universidades particulares de São Paulo sempre tiveram uma rixa muito grande, dentro e fora das quadras, no vôlei e em outras modalidades. Quando se trata de JUCA, a rivalidade aumenta.

Os quatro melhores dias do ano abrem espaço para disputas que a cada ano se tornam mais e mais acirradas. Em 2014 não foi diferente. Naquele ano, o time feminino de vôlei da PUC contava com um dos times mais fortes de todos os tempos, com veteranas que já jogavam juntas desde 2012 e bixetes com raça e vontade de vencer. “O time já era forte e completo, tínhamos um técnico que nos acompanhava havia um tempo e, bem nesse ano, entraram cinco meninas novas, o que foi muito importante”, conta a então vice-presidente da atlética e veterana do time, Bruna Rebouças.

Com o início do semestre, os treinos foram acontecendo, e, a partir disso, o time foi se entrosando e se desenvolvendo cada vez mais. “Começamos a treinar sem nenhuma expectativa, só queríamos ter o melhor desempenho possível no JUCA. Não havíamos estipulado nenhuma meta”, continua Rebouças.

Time de vôlei feminino da PUC. Fonte: Atlética de Comunicação da PUC-SP


Para Sarah Lucena, bixete daquele ano, a equipe não era a favorita: “Mesmo com um time forte, sabíamos que não seríamos as favoritas, porque a PUC-SP nunca é. Em contrapartida, sabíamos que tínhamos potencial e que iríamos lutar até o fim e tentar vencer de qualquer jeito. Para mim, acho que o importante não é ser favorito, mas surpreender o outro time dentro de quadra. Os melhores jogos são os que resultam em viradas inesperadas”.

Entretanto, com o chaveamento, a falta de expectativa deu voz a metas muito possíveis. “Quando saíram os confrontos nos animamos. Nosso primeiro jogo era contra a PUCCAMP, um time que não tem muita tradição, diferente do Mackenzie, para quem havíamos perdido na estreia nos últimos dois JUCAs, conta a vice presidente da atlética. “A partir desse momento a expectativa não estava mais no primeiro jogo, mas na semifinal. No chaveamento após o primeiro jogo poderíamos pegar o Mackenzie, que provavelmente passaria de fase. Isso significava que as enfrentaríamos de novo, mas dessa vez seria diferente, o time todo estava engasgado com as eliminações nos JUCAs de 2012 e 2013”, completa.

De malas prontas para Registro, cidade no interior de São Paulo com pouco mais de 53 mil habitantes e sede dos jogos daquele ano, o time embarcou em uma jornada que mudaria tudo. Contra a PUCCAMP não houve novidade, o time atropelou as meninas do interior por 2 sets a 0 com parciais elásticas. Para Dora Abrahão, bixete de 2014, foi uma boa estreia em competições: “Foi um jogo muito tranquilo e importante pra gente se adaptar e se conhecer. O legal é que após o primeiro jogo eu comecei a me sentir realmente parte do time e nós crescemos muito.”

Com a semifinal garantida, vinha então o jogo decisivo: Perdizes X Consolação. Seria esse jogo a terceira eliminação seguida para o time da Maria Antônia ou a tão esperada revanche? “A partir daquele momento era uma questão de raça e de honra ganhar a partida, era uma questão de a gente mostrar a nós mesmas que era possível. Nós não tínhamos a metade dos incentivos ou da estrutura delas, mas tínhamos o dobro da vontade”, relata Lucena.

“A gente sabia que elas eram fortes, que como conjunto elas eram muito boas, mas estávamos muito mais pensando na gente e no que tudo significava do que tentar analisar friamente qual time era melhor”, diz Dora. “Eu não conseguia entender o sentimento que as meninas tinham a respeito do que tudo representava até uma hora antes do jogo, quando nosso técnico nos chamou pra conversar e nos mostrou um vídeo de várias pessoas nos encorajando, contando as histórias da rivalidade contra o Mackenzie e de como o que a gente estava prestes a fazer era muito importante”, continua.

Time e técnico reunidos antes da semifinal. O resultado do jogo mudaria a modalidade para sempre. Fonte: Atlética de Comunicação da PUC-SP

Para analisar o que foi o jogo e tudo o que envolvia, talvez seja mais fácil fazer uma analogia com o jogo Brasil x Rússia, válido pelas quartas de final do vôlei feminino nos Jogos Olímpicos de Londres em 2012. Para se entender o contexto, a seleção brasileira havia chegado àquele jogo após uma sufocante primeira fase: um mero 4º lugar, alcançado após uma derrota por 3x0 para a Coréia do Sul e uma vitória magra, por Tie-break contra a Turquia. Enquanto isso, as russas, que já haviam eliminado o Brasil na semifinal das Olimpíadas de Atenas e nas finais dos mundiais de 2006 e 2010, viviam um ótimo momento na competição, passando por uma primeira fase com cinco vitórias em cinco jogos.

Aquele jogo era muito mais do que uma vaga nas semifinais, era uma oportunidade de tirar o grito da garganta e afastar todos os fantasmas, exatamente o que foi a semifinal do JUCA 2014. No jogo contra a Rússia, parciais apertadas, ponto lá, ponto cá. No final, um tie break de tirar o fôlego, com seis match points para as europeias, todos tirados com maestria pelas brasileiras. Após o ataque de Fabiana e o apito final, alívio, (muito) choro e felicidade.

A partida contra o Mackenzie foi tudo isso. Rivalidade histórica, o fantasma das eliminações passadas e qualidade técnica extrema. Cada bola era definitiva e cada ponto aumentava a expectativa da torcida. Um ponto lá, um ponto cá. 1º set nosso, 2º set delas. Tie-break. “Fomos pro 3º set pensando que precisávamos ganhar o jogo, não havia outro jeito de sair da quadra sem ser com a vitória. Acho que tudo funcionou porque todas acreditavam muito nisso”, diz Rebouças.

“Eu defendi muitas bolas e cada defesa que eu fazia eu me sentia mais confiante. Realmente foi o jogo mais disputado da minha vida”, conta Dora, “Eu lembro muito do último ponto, estava 14x13 pra gente e acho que nunca senti algo tão bom quanto ver aquela última bola caindo no chão do Mackenzie, foi uma coisa surreal”, explica.


Torcida cantando e apoiando o time durante o jogo. Fonte: Atlética de Comunicação da PUC-SP

“A torcida estava enlouquecida, nunca vi a bateria tocando daquele jeito. Quando o jogo finalizou, as meninas caíram no chão, todas ficaram muito emotivas e foi uma das experiências mais gratificantes da minha vida”, relata Sarah. “Foi depois daquele jogo que eu e outras meninas do time resolveram entrar para outros esportes e pra Atlética, onde virei Diretora Geral de Esportes e depois Vice-Presidente. ”, completa.


Comemoração entre o time e a torcida após uma vitória que entraria para a história. Fonte: Atlética de Comunicação da PUC-SP

Com a vitória e a vaga inédita na final, o time colocou a PUC no mapa do vôlei feminino. “A Pontifícia passou a ser respeitada e temida na modalidade e o time ganhou muita confiança. Depois de vencer aquela partida conseguimos uma vaga na NDU, onde conseguimos feitos interessantes, como ganhar da Medicina da USP, conta Lucena. “Acho que o maior legado disso tudo foi que nós conseguimos mostrar que não era só o Cachorro (futebol de campo) que merecia atenção. Mostramos que com esforço e vontade os outros esportes também poderiam chegar lá”, completa.  

Menina(s) de Ouro

21 de março de 2018

POR ENZO KFOURI


Fanny Durack. Vencedora da prova dos 100m livres da natação nos Jogos Olímpicos de Estocolomo em 1912. Teve de bancar sua própria ida porque o governo australiano achava uma perda de dinheiro enviar mulheres para competir. Theresa Weld. Medalhista de bronze na patinação artística na Antuérpia em 1920. Foi criticada por um dos jurados, pois suas manobras eram consideradas “impróprias para uma dama”. Joan Benoit.  Campeã olímpica da maratona feminina em Los Angeles 1984 quando acreditava-se que as mulheres não eram capazes de competir em provas longas de corrida.

Três nomes pouco conhecidos, mas que possuem uma grande importância para o esporte mundial pelas barreiras por elas rompidas. Em um ambiente predominantemente ocupado por homens, o que vemos nessas e em outras mulheres são exemplos da luta diária pela equidade de gênero no esporte de alto rendimento e também fora dele.

Andreia Bandeira (Vermelho) em disputa com Atheyna Bylon (Azul) pela categoria de até 75 kg do boxe feminino na Rio 2016. Modalidade feminina entrou para o programa olímpico em 2012.  Fonte: Saulo Cruz/ Exemplus/ COB


Como muitos já sabem, os Jogos Olímpicos no formato que temos hoje é inspirado nos Jogos Panatenaicos, ou Jogos Olímpicos da Antiguidade, que eram realizados na Grécia Antiga no santuário de Olímpia, em homenagem a Zeus. Era um evento religioso, que não podia ser disputado nem assistido por mulheres, sendo a única presença feminina permitida a das Sacerdotisas, as “mensageiras dos deuses” que traziam boa sorte aos competidores e entregavam as coroas de oliveira aos campeões.

Essa visão ultrapassada seguiu viva no renascimento do espírito olímpico nos primeiros jogos da modernidade em 1896, que ocorreu a partir da iniciativa do francês Pierre de Fredy (Barão de Coubertin). Na época acreditava-se que os Jogos eram “coisas de homem” por motivos culturais, antropológicos e, principalmente, físicos. A verdade é que a mulher ainda era vista como sexo frágil, havendo a crença de que o sexo feminino não possuía capacidade física para disputar e aguentar competições que tivessem qualquer contato físico.

Para protestar contra essa ideia, a grega Stamata Revithi acabou realizando o percurso da maratona de 40km um dia após a prova masculina dos jogos desse mesmo ano. No final, conquistou um tempo inferior a alguns homens que competiram oficialmente, o que comprovou que as mulheres tinham capacidade para competir se quisessem.

Tabela 1: Ascendência da participação feminina nas Olimpíadas. Fonte: COI, 2011

Entretanto, a participação das mulheres só foi aceita em termos na edição seguinte, em 1900, quando elas podiam competir em dois esportes: o tênis e o golfe, por serem consideradas modalidades mais leves. Mesmo assim, eram consideradas atletas extra-oficiais que não recebiam medalhas ou coroas de oliveira, somente o certificado de participação.

Aos poucos o COI (Comitê Olímpico Internacional) foi permitindo a participação feminina, porém sempre em modalidades que não exigissem muito do físico. Tudo começou enfim a mudar em 1917, quando uma francesa chamada Alice Milliat cria a Federação Esportiva Feminina Internacional, que reivindica a entrada efetiva das mulheres nas competições de atletismo e de outras modalidades das Olimpíadas.

Para pressionar o COI, a federação acaba criando os Jogos Olímpicos Femininos em 1922, que são realizados novamente em 1926 e 1930. Devido ao sucesso de público, o esporte feminino ganha destaque e é integrado definitivamente ao programa oficial da entidade em 1936.

Maria Lenk em reportagem do jornal Sport Illustrado. A nadadora foi a primeira brasileira a competir pelo Brasil. Fonte: Sport Illustrado

No Brasil o desenvolvimento do esporte feminino também foi lento. A primeira atleta brasileira a competir pelo país foi a nadadora Maria Lenk, nos jogos de 1932 quando tinha apenas 17 anos. A partir disso a participação das brasileiras em olimpíadas continuou a crescer, mas ainda de maneira precária e com pouco incentivo.

As primeiras medalhas femininas saíram em Atlanta 1996, em que o vôlei de quadra, que contava com nomes como Fernanda Venturini, garantiu o bronze, o time de basquete de Hortência e “Magic” Paula, a prata, e o vôlei de praia de Jacqueline e Sandra Pires, o inédito ouro. As primeiras medalhas individuais vieram somente em Pequim 2008, quando Ketleyn Quadros faturou o bronze no judô e Maurren Maggi, o ouro pelo salto em distância.

Jacqueline (esquerda) e Sandra Pires (direita), campeãs do vôlei de praia, comemorando a primeira medalha de ouro feminina brasileira da história em Atlanta 1996. Fonte: Guia da Semana


Quando falamos sobre a participação da mulher no esporte, tem-se a falsa ideia de que o mundo já superou essa visão arcaica e que vivemos um período de plena igualdade. Talvez hoje não haja o impedimento da participação de uma atleta mulher somente por se acreditar que ela não seja capaz pelo esforço físico, entretanto vale ressaltar que foi somente nos jogos de Londres em 2012, com a entrada do boxe feminino, que as mulheres puderam competir em todas as modalidades disponíveis. É somente desde a penúltima edição das Olimpíadas que há uma real equidade de gênero e é por isso que muita coisa ainda tem que mudar. 

Felizmente já passamos da discussão sobre “ser permitido ou não uma mulher competir”, porém,  ainda há muito que contestar, como a falta de incentivo ao esporte feminino e as diferenças de salário entre atletas homens e mulheres. O que também é curioso é que por mais que hoje não se argumente sobre a participação das mulheres, parece que chegamos a outro embate: a participação de transexuais. Mas isso já é assunto para outro texto.

A influência da pornografia nas relações sexuais

20 de março de 2018

POR THAYS REIS


Campanha contra assédio e violência sexual. Foto: Faël Isthar

Com o advento da internet, a indústria pornográfica passou da dificuldade de acesso dos filmes e revistas para um compilado infinito de vídeos que pode ser acessado de qualquer lugar.. A sua grande disseminação entre jovens e adultos revela inúmeras consequências na saúde sexual e mental de muitos jovens, desde atitudes agressivas no sexo até a total ignorância do prazer feminino, que é absolutamente negado nos sites pornôs.

Segundo informações do Daily Mail com jovens britânicos (não há muitas pesquisas sobre o assunto no Brasil), a maioria dos adolescentes assiste “conteúdo adulto” pelo menos de duas a três vezes na semana. Dois terços de jovens entre 11 e 13 anos já viram pornografia online, cuja frequência aumenta junto com a idade: 75% dos jovens de 13 a 17 anos já viu esse tipo de conteúdo. Isso significa que, desde o início da adolescência, os jovens estão expostos a formas de sexo que não são, nem deveriam ser, a realidade. Mas uma forma de se relacionar que decorre de uma sociedade machista e violenta.

Como os filmes são feitos, obviamente, para o público masculino, os garotos são os mais afetados pelas visões de mundo expostas nos filmes. Na grande maioria, não se explora a sedução, as conversas, a conquista, que são partes fundamentais para um sexo saudável e consentido, o que não se trata de romantizar o sexo, mas de tratá-lo com verossimilhança sem objetificar os protagonistas da relação. 

A única coisa realmente valorizada nos vídeos é a penetração. Sem toques, sem beijos, sem olhares, sem nem mesmo mostrar o prazer que poderia advir daquilo. Apenas uma penetração mecânica onde o homem mal toca a mulher e ela. por sua vez, se preocupa apenas em não estragar seu cabelo e maquiagem, além de claro, fingir prazer.

Mais do que a frieza, a violência e a brutalidade no sexo são extremamente normalizadas, explorando a hierarquização dos gêneros, quando o homem está sempre em posição de dominação sobre a mulher submissa. O extremo desse domínio e violência estão presentes em categorias como “hardcore” e “estupro”, que tornam normal e corriqueiro um homem sentir prazer em ver uma mulher sendo abusada, enforcada, chorando ou coisas muito mais violentas que isso.

O quão problemático é sentir prazer com a dor do outro? Esse desejo de dominação e poder sobre mulheres advém, não de um fetiche individual, mas de uma sociedade machista e falocêntrica que prioriza o prazer do homem e sequer coloca em pauta o prazer feminino – exageradamente representado nos filmes com mulheres gritando, quando nem ao menos estão sentindo prazer – mas que idealiza sempre a mulher “boa de cama” que é submissa, não expressa seus desejos e vontades, mas que satisfaz todos os desejos masculinos.

Esse tipo de dominação é explorado não só em filmes pornográficos, mas em sucessos de bilheteria como “50 tons de cinza” que, para além do sadomasoquismo, aborda essa questão do limite entre prazer e dor, entre a vontade de realizar um fetiche pessoal e ao mesmo tempo levar em consideração o que a outra pessoa. E mais que isso, ensinar uma forma violenta de se relacionar com uma pessoa que não necessariamente gosta ou quer se relacionar dessa forma, mas se submete por acreditar em sentimento romântico que pode vir disso.
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Outro filme que aborda essa temática é Operação Red Sparrow, com protagonismo de Jennifer Lawrence na personagem Dominika, que se envolve com a espionagem russa e aprende a decifrar o que as pessoas desejam e conseguir o que quer através disso. Em uma das cenas, após Dominika sofrer uma tentativa de estupro, ela é convidada por sua superior a dar ao homem que tentou estuprá-la, o que ele deseja. Dominika tira suas roupas e se mostra disponível para ter relações sexuais. Quando ele não fica excitado, ela diz algo como “Ele não quer sexo, ele quer poder”. 

Mais assustador é quando a violência sai da tela do cinema para a vida real, em forma de violência no sexo com mulheres e suas representações, como a brutalidade ocorrida no Festival de Arte Eletrônica de Linz, em 2017, contra a boneca Samantha, um robô que imita uma mulher, com sensores em áreas erógenas e inteligência artificial, capaz de aprender frases e coisas que o possível parceiro goste.

Boneca Samantha. Reprodução: O Globo Blogs
Na visão da indústria pornográfica, Samatha é a personificação de “mulher perfeita”: calada, submissa, sem desejos ou vontades e utilizada apenas para realizar os desejos masculinos. E foi exatamente isso que participantes da feira fizeram, realizaram seus desejos: sujaram, humilharam e estupraram um robô que representa uma mulher. Quebraram seus dedos, pernas, arrancaram seus seios e a deixaram tão danificada, que seu corpo não poderia ser mais utilizado, apenas sua tecnologia interna.

Samantha se presta a imitar uma mulher real e a atitude de um grupo de homens que se sentiu à vontade para aplicar à boneca todo tipo de castigo que a lei severamente puniria se fosse aplicado a um ser humano, representa uma ameaça real às mulheres, já que só o que impede alguns homens de cometer esse tipo de violência é o medo e a culpa, mas aprenderam a ser violentos e a sentir prazer com isso. 

O comportamento violento nas relações sexuais não se dá apenas por conta da pornografia, mas por conta de uma sociedade machista e misógina, dentro da qual os conteúdos adultos estão inseridos e se mostram de forma clara e óbvia. Os vídeos e filmes não só incentivam o comportamento agressivo, mas normatizam a falta de respeito com as mulheres, a ignorância de seus desejos e vontades. 

Sem nem entrar no mérito dos perigos e violências sofridas pelos atores e, principalmente atrizes, que são 70% das protagonistas, que geralmente não chegam nem aos 50 anos, por conta de drogas, DST’s ou assassinatos. Nem na problemática de “teen” ser o tema mais pesquisado em sites de conteúdo adulto, em alusão a pedofilia. Nem aos estereótipos de homem branco dominador, adolescente branca ingênua e inexperiente, mulheres não-brancas como exóticas e “aventuras” sexuais e homens negros como “bem-dotados”. Ideias que são consumidas subjetivamente durante o conteúdo dos vídeos.

Esse tipo de conteúdo traz inúmeras violências, explícitas, implícitas e causam consequências tanto em quem está envolvido ativamente nessa indústria, atores e atrizes, como em quem a consome.

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